Embora rara,a gravidez é possível em mulheres em tratamento dialítico.O diagnóstico de gravidez em uma paciente renal é dificultado pelo fato de habitualmente apresentarem valores elevados do hormônio beta-hCG.Apesar da melhoria no tratamento dialítico, ainda existe o elevado risco de hipertensão arterial, contribuindo para elevados números de partos prematuros.Estudos recentes apontam para uma idade gestacional média de apenas 30,5 semanas. Conversei com o Dr. César Centofanti, nefrologista formado pela UFG - Goiânia especialista em Hemodiálise.
VR - É frequente a gravidez em mulheres que estão em tratamento dialítico?
CC - A gravidez entre pacientes em tratamento dialítico não é freqüente. Ocorrem várias alterações hormonais, tanto com as mulheres como com os homens em estágio avançado da doença renal, que implicam em redução da fertilidade.Para a mulher isso se manifesta na irregularidade ou até mesmo na falta da menstruação.
VR - Quais são os riscos para paciente?
CC - Os riscos para a paciente são mais relacionados às doenças associadas que ela apresente como diabete, insuficiência cardíaca, e outras. A gravidez pode causar a descompensação destes quadros. Contudo, a condução adequada pelo médico assistente e a adesão da paciente ao tratamento podem fazer com que esta fase passe sem maiores tropeços, como qualquer gravidez.
VR - Quais são os riscos para a criança?
CC - Os maiores riscos no processo envolvem justamente o feto. Como os níveis de uréia elevados da mãe são intoleráveis para ele, a grande maioria dos casos resulta em aborto espontâneo.Geralmente a paciente nem mesmo toma consciência da gravidez.
VR - O que muda na sessão de hemodiálise durante a gravidez?
CC - Na tentativa de tornar o ambiente mais tolerável para o feto, vários esquemas foram tentados em todo o mundo. Atualmente, o que conta com maior aceitação, com aumento considerável de gestações bem sucedidas, é o de sessões diárias durante a gravidez. Ou seja, a paciente passa a receber 6 sessões semanais de hemodiálise, mantendo o horário habitual (4 horas de sessão).
VR - E para terminar, quais os cuidados que a paciente deve tomar durante este período?
CC - Alem da mudança do esquema de hemodiálise, o trabalho em conjunto do nefrologista, do obstetra e da nutricionista é de extrema importância no sucesso da gravidez. Assim, seguir com rigor as recomendações, que não são poucas, é indispensável. As consultas do pré-natal ocorrem em intervalo reduzido, para constante avaliação do desenvolvimento fetal. A quantidade e qualidade da alimentação são verificadas constantemente, lembrando que o que chega até o bebê é o que a mãe come.Contudo, nesta situação quaisquer excessos podem ser prejudiciais para ambos.
Athina Souza, aposentada e estudante do 6 ° período do curso de Direito, faz hemodiálise há dez anos e há dois engravidou. Athina disse que quando descobriu que estava grávida, de doze semanas, teve um misto de alegria e preocupação. Por ser totalmente contra o aborto, ela disse que nem se os médicos mandassem, ela faria. Estava feliz demais com a gravidez, mesmo não tendo sido planejada. Como ela tinha que dialisar todos os dias, acabava sacrificando demais o acesso, então os médicos liberaram para que ela fizesse apenas 5 dias na semana, com oxigênio durante 03 horas. Apesar de tanta felicidade, ela disse que não pôde curtir a gravidez como as outras mães, pois o cuidado é dobrado. ”Fui diversas vezes parar na emergência do hospital”, diz ela. O bebê nasceu com 06 meses de gestação com 633 gramas, uma menina. Mas infelizmente ela não sobreviveu. “Nem o fato de perder o rim, e voltar para hemodiálise me fez tão triste quanto à perda da minha filhinha.” disse. Apesar de ser uma gravidez de alto risco, Athina disse que faria tudo de novo, não para substituir sua filha, mas pela majestade de ser mãe.
Já Andréia Patrícia, 35 anos e em tratamento dialítico há sete, teve uma surpresa maravilhosa em 2005, quando descobriu que estava grávida de três meses. Andréia disse que durante a gravidez ficou muito sensível e que chorava por qualquer motivo. Assim como Athina, também decidiu levar a gravidez adiante, mesmo contra a vontade dos médicos que a acompanhavam.Teve que lutar contra o preconceito das pessoas que diziam a todo instante que era louca e incapaz de cuidar de uma criança, se referindo á doença renal. Andréia disse que teve uma gravidez tranquila e sem nenhuma intercorrência mais grave.Teve o bebê com seis meses de gestação, com parto normal e tiveram, mãe e filha, uma recuperação surpreendente.Depois de 21 dias já estavam em casa.
“Ana Luiza é um tabu quebrado, um preconceito vencido.É minha vitória espelhada em um ser vivo. Em cada pequeno gesto me prova que estou viva e sou importante para alguém. Que sou capaz, necessária e única. Depois de muito tempo de hemo, deixamos de acreditar em nós mesmos, achamos que ninguém precisa de uma pessoa doente e que somos um peso para nossa família. Mas hoje, depois dessa experiência me sinto mais forte para enfrentar o tratamento e tudo que ele acarreta. Pois sei que tenho pessoas que me esperam em casa, ansiosas para me ver bem.” disse Andréia.